1 de dezembro de 2016

Especial Retratos: Grandes Nomes do Samba de São Paulo

Foi entre um café no lar de Oswaldinho da Cuíca, a tradicional feijoada da Dona Inah no Brooklin, uma reunião comunitária com a sambista e deputada Leci Brandão no quilombo de Cançandoca, uma manhã na Casa Verde com Mestre Dadinho, almoço no extremo norte com a rainha Duda Ribeiro, bolo e suco na zona leste com a Dama do Berço do Samba de São Matheus, Tia Cida, além da breve visita ao templo do samba da Unidos do Peruche com o anfitrião e sábio Seu Carlão, e uma corrida tarde para fotografar o mestre Moisés da Rocha, que esta série fotográfica se fez. 

Entre 2015 e 2016 tive a oportunidade de estar, aprender  e fotografar forças que fazem e mantém viva a história do samba de São Paulo, e em celebração ao Dia Nacional do Samba, 02 de dezembro, compartilho algumas dessas imagens. Sorrisos acolhedores, histórias de marejar os olhos e uma sabedoria que somente os grandes mestres possuem. Lições de vidas traduzidas em retratos das verdadeiras divindades da nossa cultura centenária. 



Leci Brandão: Leci Brandão da Silva, nasceu e foi criada nas proximades da Portela, Vila Isabel e Mangueira, redutos do samba carioca. É cantora, compositora e uma das mais importantes intérpretes de samba da música popular brasileira. Sua carreira teve início no começo dos anos 70, quando tornou-se a primeira mulher a fazer parte da ala de compositores da Mangueira. Leci é uma artista versátil, como prova atuou na novela Xica da Silva na extinta TV Manchete, com a personagem SeverinaUma das mais importantes mulheres negras da história do Brasil e um dos grandes nomes do Samba, deputada estadual em seu segundo mandato, começou sua carreira artística em 1970 e foi a primeira mulher a participar da ala de compositores da Mangueira.



Mestre Dadinho do Camisa: O paulista Eduardo Joaquim nasceu 08 de agosto de 1943. Conhecido como Seu Dadinho, fez carreira nos Correios, mas sempre dividiu o seu tempo e dedicação com samba. Seu Dadinho é considerado um dos fundadores da escola de samba Camisa Verde e Branco e conviveu com grandes baluartes como Seu Inocêncio no Camisa Verde, Pé Rachado da Vai-Vai, Seu Carlão do Peruche, Madrinha Eunice no Lavapés (primeira escola de samba de São Paulo, ainda em atividade) e Alberto Alves da Silva da Nenê de Vila Matilde. Todas essas personalidades plantaram a semente do samba no estado de São Paulo. Ritmista e compositor de mão cheia, já coordenou a bateria da escola e escreveu canções como Peso da Tradição, Festa No Morro, Malandro Vacilão, Canto Pra Viver, Revelação, Eta Samba Bom.



Dona Inah: Nascida em Araras, no interior paulista, Ignez Francisco da Silva, a Dona Inah, é filha de músico. Aos nove anos já cantava nos bailes das fazendas da região e nas festas da cidade. Com menos de 20 anos de idade, mudou-se para Santo André, onde venceu o concurso “Peneira Rodini”, que lhe abriu as portas para os clubes, bailes, orquestras e rádios, em especial a Rádio Record. Em 2008, lançou o disco “Olha quem chega”, inteiramente dedicado à obra de Eduardo Gudin. Em 2010, Dona Inah esteve em Cuba, onde gravou 14 canções com músicos cubanos, cantadas em espanhol. Em 2011 participou do projeto “Damas do Samba”, em homenagem à Clara Nunes, Clementina de Jesus, Jovelina Pérola Negra e Dona Ivone Lara. Em 2013, lançou seu terceiro disco, “Fonte de Emoção”.




Oswaldinho da Cuíca: Nascido Osvaldo Barros, em 1940, Osvaldinho da Cuíca foi o primeiro Cidadão Samba Paulistano, em 1974. Integrou o grupo Demônios da Garoa em três momentos. Fundador da ala dos compositores da Vai-Vai, desde então teve seis sambas seus desfilados pela tradicional escola de samba do Bexiga. Três deles campeões, incluindo "Na Arca de Noel Quem Entrou Não Saiu Mais", de 1978, que deu o primeiro título à escola. A alcunha Osvaldinho da Cuíca lhe foi dada na época em que participou do grupo do poeta Solano Trindade.



Tia Cida: Maria Aparecida da Silva Trajano nasceu no dia 26 de novembro de 1940 em São Paulo. É filha de Maria Ercília da Silva Rosa e Otávio Henrique de Oliveira, conhecido como Blecaute, compositor de “General da Banda” (1949) entre muitos outros clássicos do carnaval de rua. Tia Cida ou Tia Cida dos Terreiros, é a mãe do lugar que ficou conhecido como o Berço do Samba de São Mateus, na zona leste de São Paulo. Sua casa se tornou um tradicional reduto do samba por acolher músicos, sambistas e apaixonados pelo gênero que faziam e continuam a fazer grandes rodas de samba, tendo tia Cida como matriarca e referência. Tia Cida gravou seu primeiro disco aos 73 anos de idade com incentivo e produção do Quinteto em Branco e Preto, grupo que viu nascer nas rodas de samba de seu quintal.




Moisés da Rocha: Seu primeiro contato com o rádio foi em busca do sonho de ser cantor. O timbre de sua voz, no entanto, chamou a atenção para além da música que interpretava. Foi assim que Moisés da Rocha conseguiu o seu primeiro emprego como locutor. Como radialista, entre suas conquistas estão o pioneirismo na rádio FM com um programa totalmente dedicado ao samba. Chamado “O Samba Pede Passagem”, o programa foi ao ar pela primeira vez em 1978, na rádio Universidade de São Paulo FM. O programa resgatou a força do gênero, abrindo caminho para muitos artistas. O “Samba Pede Passagem” representa um símbolo na luta pela valorização das raízes culturais afro-brasileiras, que atua por meio da música.




Dona Duda Ribeiro: Dulcinéa Ribeiro é professora de Educação Musical e Expressão Corporal, cantora, relações públicas, diretora de ala e apresentadora de eventos. Nasceu no Rio de Janeiro, mas foi criada em São Paulo, no bairro da Lapa, zona oeste. Militou por 9 anos da Escola de Samba Vai Vai a convite do padrinho, o sambista Geraldo Filme, e depois no Camisa Verde e Branco a convite do Sr. Carlos Alberto Tobias. Foi dançarina e, depois, backing vocal do programa Show do Sargentelli na década de 70 e a única mulher a integrar o tradicional JB Samba. Foi eleita Cidadã Samba de São Paulo em 2005 por unanimidade, e agraciada com o título de Embaixatriz do Samba de São Paulo pela Embaixada do Samba Paulistano.




Seu Carlão do Peruche: Carlos Alberto Caetano nasceu no dia 11 de setembro de 1930 na região da Santa Cecília e Barra Funda, zona Oeste de São Paulo. Aproximou-se do samba quando conheceu a Lavapés, a mais antiga escola de samba paulistana ainda em funcionamento fundada por Madrinha Eunice. Foi lá que Seu Carlão tomou verdadeiro gosto pelo samba, liderou sambistas ainda adolescente e de onde saiu, em 1955, para formar sua própria agremiação, a Escola de Samba Unidos do Peruche, fundada em 1956 no bairro da Casa Verde. Além de ser um personagem importante da história do samba paulista, condecorado Embaixador do Samba pela União das Escolas de Samba de São Paulo, Seu Carlão é um exímio contador de histórias. Como um griô ele carrega consigo a sabedoria de quem muito viveu e aprendeu com os mais velhos. Seu Carlão não só fundou a Peruche como militou e milita pela tradição do samba paulista.


Fonte, Iniciativa e Produção: Mandato Deputada Leci Brandão
Fotos: Roger Cipó © Olhar de um Cipó - Todos os Direitos Reservados / All Copyrights Reserved












ABATE RELIGIOSO E CRIME AMBIENTAL



A Lei de Crimes Ambientais possui quatro regras diretamente relacionadas com a proteção da fauna: 
1. proíbe o abate, caça e utilização de animais silvestres (nativos, exóticos, espécie rara ou em extinção) sem licença ou autorização de autoridade competente;
2. pune o abuso, ferimento ou mutilação de animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos;
3. condena a venda, aquisição, guarda ou manutenção em cativeiro de espécime silvestre proveniente de criadouro clandestino e sem autorização de autoridade competente;
4. reprime o uso de método cruel para o abate ou captura de animais.

Também a Lei das Contravenções Penais proíbe crueldade, imposição de trabalho excessivo, experiência dolorosa ou cruel em qualquer espécie de animal.
No caso de abate, a lei penal exige autorização prévia somente na hipótese de animal silvestre, nativo ou exótico.

Independentemente da espécie de animal, a lei proíbe abuso, crueldade ou maus tratos. 
Ao IBAMA (Instituto Nacional do Meio Ambiente) compete publicar as listas dos animais silvestres, nativos, exóticos, raros ou em extinção.

Grosso modo pode-se dizer que silvestre (selvagem) é aquela espécie animal que nasce e vive em ecossistema natural, como florestas e savanas, não é adestrável e seu ciclo de vida independe da ação humana.

Nativo é o animal silvestre cujo habitat natural situa-se nas regiões do Brasil, ao passo que o exótico normalmente tem origem em habitat estrangeiro.

De seu turno, domésticos são os animais que têm comportamento adaptável à presença humana, seu ciclo de vida depende do ser humano e podem viver em cativeiro.
Merece atenção o fato de que a lei autoriza a criação em cativeiro e o abate das tartarugas “tracajá”, “muçuã” ou “jurárá”, “pitiú” ou “iaçá”, as quais podem ser adquiridas em criadouro autorizado pelo Ibama. Também o faisão poder ser adquirido nestes criadouros.

Já o cágado é considerado animal silvestre (há 16 espécies no Brasil), sendo que seu abate configura crime ambiental.

A legislação também proíbe a criação e comercialização do caramujo-gigante-africano “achatina fulica”, um molusco que não pode ser confundido com o grande caramujo branco (megalobulimus paranaguensis), espécime brasileira. 

O caramujo-gigante-africano é considerado animal exótico invasor e ainda transmite doenças como meningite e parasitose.

Recomenda-se, portanto, todo cuidado nesta seara. 
Obedecidas estas normas, entre outras sobre as quais falaremos oportunamente, o abate religioso constitui uma prática autorizada e protegida pelas leis brasileiras.

Por Hédio Silva Jr. - Advogado, Mestre e Doutor em Direito pela PUC-SP, ex-Secretário da Justiça do Estado de São Paulo (2005-2006)
Foto: Roger Cipó © Olhar de um Cipó - Todos os Direitos Reservados / All Copyrights Reserved

21 de novembro de 2016

São Paulo recebe exposição fotográfica sobre a vida no candomblé



A dança sagrada, a beleza do rito, o encontro com a divindade em transe.
Cores, formas, texturas e afetos da família de santo são traduzidos na fotografia de Roger Cipó, e compartilhados em sua mais recente exposição, Olhar de um Cipó, que abre na próxima quarta-feira, 23 às 15H, no tradicional Palácio da Secretaria da Justiça e da Defesa da Cidadania do Estado de São Paulo, no Pátio de Colégio, centro da cidade.

A exposição leva o nome da pesquisa de RogerCipó, o jovem fotógrafo e candomblecista que vem se destacando com sua sensível arte de registrar a vida ritual e social dos terreiros de candomblé. Seu trabalho propõe um diálogo visual atravpes das belezas do universo dos orixás, para desconstruir o imaginário intolerante sobre a imagem de terreiro, construído a partir das lentes do racismo religioso, ao longo do processo de demonização e marginalização da fé em divindades negras.   

Com visitação até 30 de novembro, a Exposição FotográficaOlhar de um Cipó integra a programação especial da Consciência Negra, promovida pela Coordenação Geral de Apoio aos Programas de Defesa da Cidadania, em parceria com o Fórum Inter-religioso por uma Cultura de Paz e Liberdade de Crença de São Paulo.


Saiba mais sobre a pesquisa Olhar de um Cipó pela promoção e valorização da imagem de terreiro: https://www.facebook.com/olhardeumcipo/?fref=ts


Serviço: 
Exposição Fotográfica Olhar de um Cipó
Abertura: 23 de Novembro, às 15 - Visitação até 30 de novembro.
Local: Secretaria da Justiça e da Defesa da Cidadania
Espaço da Cidadania André Franco Montoro
Largo Pátio do Colégio, 184 - Sé, São Paulo
Entrada Gratuita


2 de novembro de 2016

Infância entre Divindades - as Crianças no Xirê do Candomblé


"Feliz, a criança vive entre os deuses
Abraça deusas 
E se torna príncipe e princesa", Roger Cipó.

O candomblé é uma religião fundada pelos povos africanos, no Brasil, numa tentativa de reestabelecer as relações famíliares que foram interrompidas com o desumano processo de escravização de mulheres, homens e crianças negras, no país. 

Não a toa, comunidades religiosas se reconhecem e se organizam a partir dessas referências. São mães, pais, filhas, filhos, tios, avós, avôs de santo, constituindo famílias de axé e propagando assim um dos sistemas religiosos mais complexos do mundo, interligando humanidade e natureza, amparados nos conceitos civilizatórios africanos onde a família extensa é a base. Uma noção de família acolhedora, que respeita diversidades e abraça diferentes, pela unidade e fortalcimento da identidade individual e coletiva.

Nesse contexto, a criança de terreiro é educada com olhar especial. Aprende desde cedo o verdadeiro sentido de respeito e crescem sob à luz e cuidados de deuses e deusas africanas. "O Candomblé valoriza a família, a vida em família e é uma família; sendo assim, a criança é vista como um vir a ser e como a continuidade da família e da vida em família – ela é e deve ser elemento nuclear e protagonista neste universo africano", explica o Professor Dr. e Babalorixá Sidnei Barreto Nogueira, e completa: "neste Candomblé cíclico e contínuo, a criança iniciada tem papel de protagonista e tem seu espaço, ela é honrada, louvada e protegida, como criança, que será o futuro da comunidade, porque sabem que, efetivamente, ela o será. Em uma sociedade que nega o espaço a esta criança, encontrar um espaço privilegiado no Candomblé pode, em certa medida, compensar esta ausência e, por isso, ela gosta de estar nele"

A série fotográfica "Uma Infância entre Divindades - as Crianças no xirê do Candomblé" compartilha expressões de crianças durantes celebrações de terreiros de candomblé. Para elas, sagrados territórios, onde estão protegidas da intolerância religiosa, um dos tentáculos mais perversos do racismo, mal presente nos diferentes espaços sociais e que faz do ambiente escolar, um dos mais nocivos para quem cresce com fé nos orixás, como constatou a pesquisadora e professora Stela Guedes Caputo. Confira a série: 





























27 de setembro de 2016

10 anos de Águas de São Paulo terá show de Arlindo Cruz e Prêmio à Personalidades da Luta Contra Intolerância

Sob o mote #JUNTOSSOMOSMAISFORTES, o Movimento As Águas de São Paulo celebra uma década de luta pelo fim da discrimiação e por cultura de paz.



O evento tem início na próxima sexta, 30, com lançamento do Prêmio Luiza Bairros e encerramento com show grátis de Arlindo Cruz, no dia 08 de outubro, em ato público, no Vale do Anhangabaú. O famoso sambista de Madureira, convocou os fãs: "Dia 8 de outubro, no Vale do Anhangabaú, quero todo mundo de branco, pra gente protestar contra a Intolerância Religiosa".

Idealizado em 2006 pela Iyalorixá Edelzuíta de Oxaguian, o movimento se estabeleceu a partir da mobilização do povo de axé de São Paulo, que anualmente ocupa o Vale do Anhanbagaú, na região central da cidade, promovendo um importante ato de conscientização e denuncia da violência contra comunidades de terreiro. 

Pouca gente sabe, mas 30 de setembro é  o Dia Municipal e Estadual das Religiões de Matriz Africana, em São Paulo. 


 Segundo a Iyalorixá Edelzuíta, "Foram muitos anos de luta para conseguir sancionar a Lei Municipal 14.619/07, de autoria do Vereador Wadih Mutran". Já o decreto de reconhecimento estadual se deu em janeiro desse ano, a partir de mobilizações de lideranças do movimento. 

Ela explicou ao programa de rádio web Candomblé Total, em 2015: "Sobre a lei, já me perguntaram por que 30 de setembro? Porque é o mês em que está se colhendo inhame na África, o período quando se faz as águas de Oxalá no Ilê Axé Opô Afonjá, no Engenho Velho e no Gantois, e também porque é quando se inicia a primavera. Então, achei que 30 de setembro seria uma boa data por isso e também por ser dia de São Gerônimo, que não é Xangô mas é sincretizado com ele. E Xangô é a força da nossa tradição. (...) As Águas de São Paulo não é a lavagem do Bonfim, mas o enredo é o mesmo: o povo vestido de branco, com sua jarra e flores e água de cheiro para banhar a estátua da Mãe Preta, que é o símbolo da consciência negra na cidade". Clique para ler entrevista na íntegra




Luiza Bairros é a Força Ancestral que dá nome ao Prêmio 

A eterna Ministra-Chefe da Secretária de Promoção da Igualdade Racial dá nome ao prêmio que tem como objetivo reconhecer o legado de profissionais e ativistas de diversas áreas. 
O  cerimonial de dez anos e Lançamento do Prêmio Luiza Bairros, para personalidades da luta pelos direitos dos povos de matriz africana, acontecerá no Teatro da prestigiada Galeria Olido. Entre os homenageados estão nomes como o professor Juarez Xavier, Dennis de Oliveira e Olhar de um Cipó.

Luiza Bairros foi uma das mais importantes referências políticas e sociais da luta pelos direitos da populaçao negra e das mulheres brasileira que faleceu em julho desse ano, vítima de um cancer. 

Luiza Bairros atuou diretamenta na defesa dos direitos e dignidade dos povos de terreiro


Vista-se de Branco e venha para Luta!

Em vídeo publicado pela organização do evento, Arlindo Cruz e Arlindo filho convidam para o show de celebração aos dez anos do Movimento As Águas de São Paulo.




Participe!

Serviço: 
As Águas de São Paulo - 10 Anos 
Programação: Dia 30/09, às 19H: Ato Solene e premiação. Local: Galeria Olido. Av. São João, 473; Dia 08/09, às 12H: Ato Público e show "2 Arlindos", Vale do Anhangabaú, centro de SP. 
Evento Gratuito


15 de setembro de 2016

Ile Oba N'lá - um olhar para o Terreiro de Mãe Edelzuíta de Oxaguian

Era madrugada de 26 de junho de 2014, e eu seguia rumo ao Rio de Janeiro para uma das experiências mais incríveis: registrar a festa de Xangô e aniversário do terreiro. Eu que já estava me acostumando a frequentar diferentes terreiro de candomblé, quase que não me aguentava de ansiedade para a celebração de 45 anos de fundação do Ile Oba N'lá, e os resistentes 168 anos do Okutá de Xangô, a pedra sagrada do orixá da justiça, trazida da Nigeria pelos ancestrais da matriarca do terreiro, a Iyalorixá Edelzuíta de Oxaguian, que naquele mesmo ano comemorou 70 primaveras de iniciada no candomblé, pelas mãos de Mãe Menininha do Gantois. Não era só um trabalho. Era um fim de semana cheio de significados, sentidos, imagens para registrar, depoimentos para colher, história para se emocionar e aprender... 

Após seis horas de estrada, amanheci no endereço da Vila Valqueire. O cinza do céu ficava bonito com as ruas e muros, todos pintados nos tons da bandeira do Brasil. Era copa do mundo, dia de jogo. Cheguei, de carona com a egbon Katia de Ogun - filha do Axé -, na companhia de um designer amigo que filmaria o fim de semana comigo. Como toda casa tradicional, vários filhos de santo já estavam nos afazeres do terreiro, alguns chegavam com a gente, e os que dormiram no Axé, levantaram antes mesmo do sol nascer. Aproveitamos a correria e já começamos as filmagens, fotos e colher os primeiros depoimentos. 

O dia foi passando, o céu se abrindo, como o livro de vidas que se abria diane de minhas lentes. A a cada história a alegria aumentava. É um privilégio ouvir histórias de quem se iniciou há mais de 20, 30, 40 anos e ainda se mantem no mesmo lugar, com a mesma dedicação, humildade e respeito. É inspirador conhecer trajetórias que seguem os passos de seus pais e mães e garantem novas gerações de uma família que resiste em uma periferia carioca, contra ínumeras manifestações intolerantes e racistas. 

Há certa hora do dia, um silêncio pairou sobre o terreiro. E só foi interrompido pelas vozes que humildemente pediam para ser abençoadas. Era Mãe Edelzuíta que descia as escadas de sua casa e adentrava o salão. Lembro que suei frio, e logo fui pedir sua benção também. Eu que esperava uma Iyalorixá brava, toda montada em seus lindos e alvos rechillieu, encontrei com uma senhora gentil e de uma sabedoria que se via no olhar. Me apresentei, contei parte da história sobre o que fui fazer lá. Contei parte porque  a história verdadeira era surpresa à ela, pois tratava de colher depoimentos que seriam apresentados em homenagem aos seus 70 anos de candomblé, na festa de Oxaguian, em dezembro daquele ano. Em sua voz firme e baixa, Mãe Edelzuíta me abençoe e me permitiu para ficar a vontade em sua casa, e fiquei... E tive mais um privilégio: acompanhá-la para assistir a transmissão da partida Brasil e Chile, no quintal do terreiro. Pouquíssimas pessoas a viram comentar futebol com tanta propriedade, e garanto que se ele tivesse oportunidade, tinha puxado a orelha do garoto Neymar, que mesmo ajudando no 3x2 em cima dos chilenos, deixou a desejar, segundo ela. 

Fim de jogo, segundo tempo para o terreiro. Hora dos últimso ajustes para começar a festa do Rei Xangô. Poucas vezes vi um candomblé tão harmonioso como aquele. Luxuosa era a educação das filhas e dos filhos de santo, grandiosos em suas roupas limpas, simples e cheias de energia. Cada detalhe cuidado com bastante atenção, e Mãe vinha puxando seu candomblé, fielmente à forma que aprendeu com Mãe Menininha do Gantois. Dona de uma voz linda, cantou e dançar o candomblé para Xangô, além de cuidar de orixá na sala. No auge dos seus 70 anos de iniciação, Mãe Edelzuíta conduziu uma festa linda, com maestria. E eu era só felicidades ao viver tudo aquilo. Cada orixá que chegava, chegava feliz, com a satisfação de quem atravessa o Atlântico para reencontrar seus filhos e filhas, numa noite mágica... Foi Lindo! 

Eu usaria páginas e páginas para contar detalhe por detalhe dessa experiência, que após o xirê, deu espaço para um entrevista com a Matriarca do Oba N'lá, que foi assistida ao vivo por todos os seus filhos, sentados no chão, como eu, ouviam cada palavra de sabedoria, mas vou aproveitar esse espaço para compartilhar essa história em algumas imagens colhidas durante as 24 horas que me mantive ligado na vida e legado de Mãe Edelzuíta de Oxaguian. É uma longa história que ensina sobre cuidado com o outro, fé, resistência, consciência política, transformações sociais, e preservação da história africana, no Rio de Janeiro e Brasil inteiro. Ela que é uma das principais referências de sacerdócio e militância contra a Intolerância Religiosa, mantem até hoje viva a tradição do candomblé, em sua casa e vida. Como não se encantar com alguém que, aos nove anos de idade assumiu a responsabilidade de rezar e cuidar de uma pedra que trazida da África, porque sabia que era mais que uma pedra, é Xangô em essência, é justiça por excelência, é a vida africana que atravessa gerações e fortalece o axé do candomblé. 

Acho que precisarei de um outro momento para escrever mais sobre essa e outras maravilhas que é viver candomblé, por hora, divido o axé em série de imagens e em gratidão à Iyalorixá Edelzuíta e seus filhos e filhas por me permitirem olhar um pouco para esse mundo lindo: 







































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