14 de julho de 2015

Sobre caçar Borboletas e medir Axé e Selfies


Não. Eu não tenho problema algum em falar dos problemas que o Candomblé enfrenta. Não tenho e acho que não deveríamos ter. Acho até que se falássemos mais, instigaríamos mudanças que já passaram da hora de acontecer. 
Eu até tentei não comentar sobre as fantasias de um artista muito bem seguido (e agora "perseguido") pelo povo de Santo. Tentei não comentar, mas sempre pensei sobre os temas abordados com muita veemência. 

O meu não gostar do trabalho onde Odé Caça Borboletas tem a ver com dois pontos: 1- Meu Não gosto pela estética onde os Orixás ostentam megas torços coloridos psicodélicamente. E 2- por ser da opinião que por mais que nós jovens estudemos, busquemos e nos aventuremos na literatura produzida com os contos, parábolas, rezas e receitas do culto a orixá, não teremos tanta propriedade para falar do tema, como nossos mais velhos tem e sempre terão. 
Sim, eu sou do tipo que tenta ler muito, mas que prefere ouvir muito o mais velho. 
Não me aventura a recontar - muito menos, criar - Itans porque sei que a minha pouca idade não me dá a propriedade adquirida ao longo da vida sacerdotal de um Agbá. 
Logo, lugar de gente nova, é sentado de ouvidos abertos, e a boca mais fechada possível. 

Concordo que a informação e conhecimento estão aí para todo mundo, que a internet nos ajuda a aprender e ensinar (todo mundo quer ser professor, né?), mas tratando-se de uma tradição de ensinamento oral, como me permito acreditar cegamente em tudo que me brilha os olhos na internet e descredito o que me foi ensinado em casa a partir dos anos de vivência da minha comunidade? 

Tudo bem, até entendo que há sim uma carência tremenda do povo de santo que não tem suas expectativas sanadas a curto prazo. Acontece que candomblé é um filosofia de vida e o conhecimento deve caminhar junto com a sabedoria. A sabedoria só chega com o tempo e ela que te segurará, por exemplo, quando você acordar com vontade de criar um Caçador que se embrenha nas matas atrás de Borboletas. 

Embora eu seja um grande defensor do registro fotográfico e filmado das experiências, cerimônias e cotidiano do candomblé, ainda não consigo entender o poder que as selfies tem dentro dos momentos religiosos. 

Não preciso ir longe para lembrar o episódio da Selfie no Velório - com caixão, defunto e tudo -de um sacerdote de candomblé. 
Quando vi a imagem, minha vontade era mesmo quebrar meu celular, por mais que eu sentisse falta das minhas tantas selfies que tem lá. Sim, eu uso o celular para selfies, é normal, né? 
Só não é tão normal quando se interrompe a dança sagrada do Orixá para garantir uma foto; Não é normal e é um tanto estranho optar por selfies em momentos e espaços que deveríamos trocar as câmeras de smarthphones por posturas educadamente sérias para lutar contra as inúmeras agressões sofridas pelo povo de santo, dia após dia. 

A Representatividade deu espaço à Representação (de representar personagens, Sim!) tornou-se cultura de que é preciso da selfie em todo lugar, ou melhor, é preciso estar nos lugares para garantir a tal selfie e assim vender o peixe, o Axé. 
Não basta mais só promover as luxuosas festas, consultas e tabelas de preços para momentos esotéricos, é preciso brilhar os olhos, seja com cores pscodélicas ou com selfies - palavra chata que até eu cansei de repetir, rs rs.

O maior perigo disso é que tem muita gente de bem comprando sorrisos bonitos de picaretagem travestidas de Sagrado. Isso sim é um problema grande. Da mesma maneira que, pode sim, aparecer alguém dançando com um pote e vidro na mão, justificando ser ferramenta do Senhor da tal Borboleta, já vendida como fundamento. 

Preciso dizer que, infelizmente, estamos em um caminho perigoso. Pensamos que não, mas há muitos que nos olham e conseguem perceber o que, de fato tem verdade, ou não - Isso me alivia. Alivia, mas não tira a nossa responsabilidade de arrumar a casa que tá bagunçada. Cabe a nós falarmos das nossas alegrias e tristezas, cabe a nós falarmos o que anda certo e o que não anda tão certo, para a religião não se perder mais. 

Por outro lado, e para terminar, preciso dizer também que acabamos por fazer bem a aula de idiomas, adotamos o sentido real da palavra, que pode ser definido como: "si mesmo", e colocamos em prática um contra-axé tão antigo quanto a história da religião - Olha ai, o velho Egocentrismo do Candomblé, agora vem em imagem e palavra (Self)... É verdade, estamos cada vez mais chiques e distantes, né? 

Foto e Texto: 
 Roger Cipó © Olhar de um Cipó - Todos os Direitos Reservados / All Copyrights Reserved]

2 comentários:

  1. O candomblé já homenageia suficiente o "self", ou "si mesmo", de cada um no ritual do bori, que inclusive antecede a própria iniciação para o orixá. Para além disso é demasiado e inoportuno.

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