2 de junho de 2016

Candomblé - Religiosidade que nos Liga à Força de África em Nós e N@ Outr@


Conta-se que o Deus cristão expulsou Adão e Eva do paraíso. Eles conhecem o pecado, e como penitência perderam a relação harmoniosa com o todo poderoso. Há que diga que é nesse momento de distanciamento que se nasce a religião, no sentido de religar reles mortais à divindade sagrada. Pode até ser, mas religião não é só isso, nem tampouco um branco-cistão-eurocêntrico.

Há quem pense o candomblé como religião e há que acredite que o conceito religioso é raso para uma tradição em que a divindade sagrada nunca se distancia de seus e suas fiéis. E eu concordo. Diferente de outras vertentes a relação sagrada com os deuses e deusas é uma constante. A vida co-existe com a vida de fé. Os Orixás habitam as águas doces, salgadas e águas dos corpos, habitam as folhas, as plantas, as árvores - que por sinal são tempos e ligam a terra e o céu, habitam as estradas, a terra, as montanhas, as cidades, os ventos, e tudo que é vivo. Porque os Orixás africanos e africanas são forças vitais que garantem o equilíbrio da vida na terra, em harmonia com o determinado por Olodumaré, nosso Deus.

A vida em cooperação com os Orixás, de fato, ultrapassa o conceito e religião comentado, isso porque nosso fundamento é outro, é relação direta, é entender que tudo ao redor é sagrado e que o corpo é o templo onde habita Orixá.
Candomblé é uma religião afro-brasileira de culto às divindades africanas, logo é importante que nos percebamos propagadores da filosofia e religiosidade dos deuses de África.

Nessa forma de viver, Orixá é a força para nos equilibra na estrada do viver. A medida em que permitimos que essa força se aproxime de quem somos, nos tornamos pessoas melhores. Não melhores como dizem os padrões do capitalismo, e sim melhores para as relações de vida ao redor. 

Desde que me encontrei no candomblé tenho me esforçado para viver a partir do que Orixá ensina e nos pede. Mais que nos ligar a Deus, o Candomblé nos conduz para uma busca de religar-nos a nós mesmo, perceber humanidade sagrada no outro, porque se em meu ser habita um deus, no outro também, logo o cuidado e o respeito devem ser bases importantes das relações sociais.


A minha verdade é que o candomblé fez com que eu me descobrisse negro. Uma descoberta que vai além da cor da pele, dos cabelos crespos e traços. Uma descoberta de identidade, da afirmação de uma negritude que me permite dignidade e força para gritar todos os nãos contra uma cultura racista que, quando não tenta nos limitar a padrões de belezas que não nos cabem, marginaliza nossa estética, criminaliza nossas vidas e demoniza nossa fé. Conhecer o candomblé ligou quem eu era a mim mesmo, a quem eu poderia ser, a quem eu sou. E isso é religião, isso é sagrado. Porque me faz perceber o quão sagrado o mundo pode ser, e é. 

Candomblé é a religião que permite  que encontremos o pedaço de África em nós, que fora sucumbido por uma cultura intolerante e racista que nunca se permitiu, e não se permite olhar, perceber, sentir e respeitar a humanidade da fé negra. Quem se inicia no candomblé, seja lá em qual for a nação, ou em cultos africanos, se permite nascer para a vida ancestral. Quem assim faz, faz para viver uma filosofia diferente das superficialidades de um mundo que tem banalizado por demais o sentido de fé, religiosidade e força sagrada. Faz (nasce) para aprender como a vida africana lida com as diferenças, cuida dos mais novos, dos mais velhos, respeita as mulheres, aceita opiniões divergentes, valoriza o que tem valor, não se baseia - e não deve se basear em preços.


Candomblé é o abraço dado a quem a sociedade nega afeto. É acolhimento a quem não se permite ser posto em pequenos vidros de ensaio para ter a vida esteriotipada e assistida por uma mentalidade normativa. Candomblé é o caminho para quem quer sentir que sagrado é o curso natural da vida e caminha para viver mais próximo da Mãe do Mundo, a Terra África nunca distante dos seus filhos e filhas.  

Texto e Foto: Roger Cipó © Olhar de um Cipó - Todos os Direitos Reservados / All Copyrights Reserved

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