4 de agosto de 2015

Sobre Encontrar Obaluaie, em plena Segunda-feira


Antes que o dia se acaba, preciso falar do presente que ele meu deu. Sim, tudo bem que o seu maior presente é o Silêncio, mas esse eu compartilho porque o Rei me entende.

Estava eu, calado e reflexivo sobre o papo inspirador com a fotógrafa Monica Lachman, uma irmã que vem registrando de maneira linda as belezas do candomblé de Curitiba. Sentado no universo das escadarias do Teatro Municipal de S
ão Paulo, rodeado pelas mais diferentes realidades que ali pararam como eu - gente que tinha acabado de sair do trabalho e parou para esperar alguém, gente que vive à espera de alguém, gente que não espera por mais nada nessa vida, gente que cansou de esperar e agora senta e vê a vida passar... gente sentada na vida, das eruditas e sujas escadarias do "Palácio da Arte Refinada" de São Paulo...
Lá estava eu, sentado, vendo a vida passar nos diversos degraus enquanto lia e relia as mensagens de Monica, que concordava muito comigo quando dizia em meus textos teclados sobre as lindas oportunidades de registros de amor que Orixá nos proporciona quando mergulhamos no mundo do candomblé com nossas câmeras fazendo linha entre o Coração e o Olhar.
Mas foi coisa de segundos... e foi no mundo entre abaixar a cabeça para ler a nova mensagem que saltava o display do telefone e olhar a porta do Shopping Light para ver se quem eu esperava tinha chegado, percebi um turbante e um gorro branco ressaltados pelo brilho do sol das 17h e alguma coisa. Sim, o entardecer no centro trazia a fé de um rapaz e uma moça de braços dados, dividindo apoio para o singelo balaio coberto de pano branco.

Quase que sem pensar, esqueci o chat com a querida amiga e fotógrafa, passei a mão na bolsa, achei minha camêra e segui em olhares, aquela dupla reluzida em entardecer.

Parecia mesmo cena de filme (ou eu que sou dramático), mas enquanto eu disparava, ainda que discreto, na direção dos dois, a multidão apressada insistia em fazer com que eu os perdessem de vista, restando para mim o caminho de orientar-me pelos seus turbantes e gorro igualmente brancos e destacados na multidão. 





Eu já estava pronto para atravessar a rua correndo, quando percebo que o farol fechara: Alívio!
Parei na esquina e fiquei esperando por aqueles que traziam a cura em Axé de Rei. Eu que nunca faço isso, gaguejei (É sério, eu estava emocionado!): Boa Tarde, eu posso contribuir com vocês? - Eehh, Cipó! Você é do santo, não é essa a palavra certa - Pensei, e logo tratei de me apresentar direito, antes de pedir para fazer um retrato. Mas não deu tempo de posar não, enquanto eu buscava um angulo legal e o melhor momento para o registro, populares foram se achegando, tomando (ou me dando) a minha cena para registrar a minha felicidade de encontrar alguém em pleno rito de Sabejé pelas ruas de São Paulo. 

- Oi, vocês estão dando pipoca? 
Disse a senhora que se aproximou e, como pipoca, discretamente estourou seus problemas pessoais com aqueles dois jovens religiosos na esperança de uma palavra ou receita de conforto, em uma mão cheia de flores que brotam do milho em contato com o fogo.

Foi nesse momento que meu mundo parou mais uma vez. Parou e consegui congelar na imagem que compartilho.
Congelei a foto, mas se move em mim.
E desde cedo, toda vez que olho essa imagem e visito a cena em minha memória, fico imaginando o quão foi importante para aquela senhora encontrar com esses dois filhos de Orixá. A senhora que poderia estar saindo de uma rotina cansativa de trabalho chato, ou vindo de uma consulta no médico, ou vindo de qualquer outra direção não tão agradável... A senhora que andava nas ruas pensando na cura que em algum momento te tirava a paz, se deparou com Obaluaie, o Rei Senhor da Terra, Dono Absoluto de todas as vidas, A força que possibilita renovação, personificada em balaio de palha carregado por quem crê que a Pipoca cura e floresce em melhora de Mundo. 





O que eu aprendo com isso? De verdade, não consigo explicar ainda, mas sei que desde que comecei o chat com Monica, depois de receber um alívio em forma de mensagem, numa segunda-feira que inaugura o tempo de resignificar a vida, após reencontrar a força maior em dois seres que vestiam branco e refletiam os raios de Sol (o astro rei é a Força de Omolu no mundo), e depois de presenciar o pedido de remédio para alguém que teve a benção do Senhor Tempo para cruzar, na encruzilhada do Teatro mais requintado da cidade e gritar humildemente pela ajuda de quem não conhece, mas que a alma reconhece, só consigo dizer que a força existe e que movimenta o mundo para que possamos sim interagir e provocar as mudanças em nós mesmo.

Sim, todos nós temos um pouco de sementes que precisam do calor de brilhos de sol - que podem reluzir em qualquer lugar, mas suas forças se encarregaram de, na hora certa, provocar o desabrochar das coisas mais singelas em nossas vida... fazendo-nos pipocas. Fazendo-nos estourar em flores que curam e renovam a vida de nós mesmo.

Eu só Agradeço...
Silêncio! 


 Roger Cipó © Olhar de um Cipó - Todos os Direitos Reservados / All Copyrights Reserved

5 comentários:

  1. Linda essa mensagem, que o o senhor das flores brancas nos cubra de saude

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  2. Linda essa mensagem, que o o senhor das flores brancas nos cubra de saude

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  3. Como não se emocionar?
    Que Atotô nos cubra com suas palhas, nos proteja do mal e nos cure das doenças. Que ele nos dê vida nova a cada dia que acordamos... Asè

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  4. Maravilhoso relato. Que o Rei nos proteja a todos e nos cubra com suas bençãos.

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  5. Que lindo.... :'( Ultimamente eu andava precisando de ouvir coisas boas do meu querido candomblé. Ando desanimado, mas depois do seu blog, reavivei minha fé. Nossa religião precisa de vozes como a sua. Olorum Modupé.

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