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22 de junho de 2016

"Dez anos no candomblé e sua vida financeira não melhorou?" - Um pensar sobre respostas



Depois daquele ebó, o trabalho desejado não deu certo?
Depois da iniciação, você não conseguiu trocar de carro?
Dez anos no candomblé e sua financeira não melhorou?
Quantas perguntas como essas? Quantas respostas...
E quem responde o que o outro não quer ouvir, é o quê?
Sincero!

É preciso que sejamos sinceros com nós mesmo, e principalmente com quem chega ao nosso universo religioso.
Ouço e leio histórias, a todo instante, de pessoas que chegam porque é "a salvação".
Antes de dizer que "Não. Não é", precisamos entender que a "salvação" cristã não existe em nossa religião, como a ideia de prosperidade, semelhante ao que propaga outros segmentos, também não.

Talvez, ajude muito entender que o Candomblé, por mais que seja uma religião afro-brasileira, nascida no Brasil, se baseia nas relações de interações com a natureza - e chamo de natureza, tudo que vive ao nosso redor (seja visível ou sensível), através de divindades ancestrais africanas, que são forças sagradas que nos ajudam a melhorar essas relações, nos religando a Deus (Sim! Nossa religião é Monoteísta!), ao mundo que habitamos, às relações que construímos, e a nós mesmo.

Candomblé nos religa à África em nós (para mim, isso é o mais importante). 
É o mais importante porque esse religar tem muito a ver, ou até responde as perguntas do início do texto.

Quando nos permitimos conexão com os valores africanos, ensinados pelos Orixás, entendemos e aprendemos a viver a partir de uma filosofia diferente da que existe no mundo cristianizado e catequizado. A gente passa a entender Orixá como parte de nós e não como espírito ao nosso favor - como erroneamente, ouvimos.
Quando conectados com valores africanos, a gente entende Orixá como energia fortalecedora, que equilibra nossas forças vitais, e nunca como mecanismo de triunfo, ou fórmula de sucesso.
Quando conectados com Orixá, o outro é templo de uma divindade, assim como sou, e nunca inimigo. O outro é sempre parte de mim, e a medida que, por exemplo, eu peço-lhe benção, peço licença para me conectar à sua divindade, e o movimento de retorno, me faz portal para que o outro, igual a mim, encontre força sagrada no que trago de valoroso. Sem preços.
Quando conectados com os valores africanos, a saúde é também resultado da nossa presença no mundo. É resultado do que se come, daquilo que bebe, de como dorme, de como vive, e principalmente, de como (e daquilo que se) fala. As palavras são trazidas pela sopro interno que nos deu vida. Palavra é a força mais poderosa que possuímos. Seria inocente achar que elas não determinam a boa e má saúde, né?

Reparemos que no Candomblé, até pode faltar um elemento de fundamento, só nunca pode faltar a palavra. Opte pelas boas palavras.

Ainda sobre confiança, a palavra, no pensar África, é Lei. E se o terreiro é a nossa possibilidade de reconstruir África em nós, porque não usar bem as palavras?
E, por que não significar nossas palavras?
Por que não significar nossa presença no terreiro?

Talvez, entendermos que o Candomblé não irá resolver nossos problemas financeiros é uma chave para mobilizarmo-nos a protagonizar nossas próprias vidas, assumindo os acertos e erros do cotidiano.
Talvez, aceitar que Orixá não é/nem será a fórmula para ascensão, fará com que culpemos menos as divindades pelos nossos desacertos sociais, porque uma força que tem o dom de nos ligar a deus, não pode ser responsabilizada pela infelicidade de nossas relações.

Isso não quer dizer que os rituais não sejam importantes. Eles são. Só não são a solução, tampouco responsáveis pelo desdobrar da vida.
Cada um traz África Ancestral em si. Cada África Ancestral vem por um caminho. Cada África Ancestral revive sob um destino.
O rito nos ajuda a entender por caminho melhor andar. Nunca irá definir onde chegar.
Talvez, a gente só precise respeitar e reconhecer Orixá como parte do que somos na natureza, e nunca como ferramenta distante usada somente em nossos interesses, para que a presença dessas forças sejam, cada vez, maiores em nós.

Talvez...
Não sei... Talvez eu só esteja escrevendo essas linhas para resumir que, de tantas trilhas e caminhos pelos quais nos perdemos, entender que para Orixá o Ter nunca será tão nobre quanto Ser, e que, talvez, quando a gente entender que Ser alguém melhor para a vida, é o que nos faz seres próspero, teremos todas as possibilidades de andar melhor.
[Foto e Texto: Roger Cipó © Olhar de um Cipó - Todos os Direitos Reservados / All Copyrights Reserved]

13 de outubro de 2015

Candomblé Ostentação - Dos Excessos que Gosto



Esse pensamento nada tem a ver com a cultura de ostentar excessos em pedrarias, ornamentos, balangadans, quilos de panos, paramentas absurdamente descaracterizadas - e esteticamente cheias de não sentidos, "ajeuns" glamorosos por encomendas, cerimônias rituais em locações luxuosas, seguidas de alvoradas orquestradas, cafés da manhã requintados, entre outras novidades que nos assustam a cada dia que passam a brilhar os olhos dos nossos.

Particularmente, penso que o erro já começa na associação da palavra ostentação  ao candomblé, quando essa define a cultura dos excessos de que tanto estamos cansados de  ver, ouvir e falar. No entanto, gosto do termo ostentação quando representa os luxos que poucos olhos podem ver, mas os corações sentem.  A ostentação (do latin "ostentare" que significa "mostrar") é o ato ou efeito de exibir com vaidade e pompa, bens, direitos ou outra propriedade, normalmente fazendo referência à necessidade de mostrar luxo ou riqueza.[1] O termo também pode contrair conotação positiva como por exemplo, "apesar de humilde, o sacerdote ostentava a fama de ser muito responsável no cuidado com seus filhos de santo, sempre tão bem educados".

Sim, eu gosto do candomblé ostentação, quando de forma natural e sem nenhum alarde, se ostenta amor pelo Orixá em sua essência. Gosto mesmo quando o excesso é apenas de respeito pela comunidade e por qualquer pessoa que chegar. Gosto quando o excesso é de obediência ao o que pede o Orixá e quando, excessivamente, sente-se Orixá nos quatro cantos do terreiro. Sou apaixonado por lugar com excesso de filhos prontos para a função. Sou apaixonado por candomblé que Orixá tem espaço para excesso de abraços e demonstrações de carinho por aqueles que o louvam de coração aberto, e não simplesmente saúda aquele sacerdote famoso, ou no contrário, faz cara feia e "peita" os possíveis desafetos de seus "Omo".


Pode ser desconexo pensar ostentação de sentimentos, de seriedade,  de carinho, atenção, e verdades. A ostentação trata de práticas de soberba e vaidade, logo, naturalmente quando se transborda bons sentimentos, não há tempo, tampouco necessidade de se vangloriar por amar e respeitar tanto o outro. Quem assim faz, só faz por entender a importância da afetividade, e quem cultua a ostentação do candomblé, faz por uma necessidade de atenção. Acho mesmo que a gente dando espaço para o culto de excessos errados. Cultuamos o ego e nunca o amor. Talvez, tudo seria mais fácil se nossos excessos fossem de afeto e não medidos nas quantidades, nos valores gastos, e nos luxos que preocupam tantos dos nossos, certos de que serão melhor aceitos se os olhos do visitante brilhar ao entrar na sua sala e encontrar seu orixá - mesmo que descaracterizado - impecavelmente brilhoso. 
Nossos valores são pautados nos preços e gradativamente, vamos nos perdendo numa cultura descartável sem verdadeiro valor e quase nada de Axé. 

Roger Cipó © Olhar de um Cipó - Todos os Direitos Reservados / All Copyrights Reserved



9 de setembro de 2015

Sobre Ser L'esse Orixá Quando Há Dois Lobos em Nós


Longe de mim ter respostas para todos os problemas que enfrentamos em nossa sociedade religiosa.
Por mais que eu diga e exalte o Candomblé como a religião mais perfeita e completa do mundo, preciso dizer que religião é formada por seres humanos - seres humanos são falhos, têm problemas, ânsias pessoais, ganância, inveja, e uma infinidade de defeitos. Por outro lado, seres humanos podem aprender amar, são amáveis, sonham, se comovem e possuem uma infinita possibilidade de bons sentimentos.

Falar das euforias e tempestades sentimentais humanas, me leva a lembrar uma das aulas mais lindas que já tive, onde o professor contara sobre os Dois Lobos, que uma vez foi contada para um jovem índio pelo  Ancião da Tribo dos Cherokee (tribo ameríndia). O Agbá que diz que:

 "Todo ser humano carrega consigo dois lobos - um é mau, de dentes fortes como a inveja, raiva, ciúmes, arrogância, ego e outras coisas do tipo; o outro lobo é bom, de olhar forte como a alegria, esperança, serenidade, fé, humildade, generosidade, harmonia. E todos os dias, esses dois lobos se peguem em atrito, quase que mortal." 
- Esperto, o jovem índio indaga: Mas Mestre, nessa luta, quem sai ganhando? 
- Serenamente, o Velho Sábio responde que: Nessa Guerra entre o Lobo do Bem, e o Lobo do Mal, vence aquele que você alimentar". - E penso que seja assim mesmo!

Em meio a tantos lobos, seres desumanos, e outros seres humanos fantástico, me arrisco a dizer que para nós, o caminho da paz interior, da prosperidade, sucesso, amor e boa convivência, é mais fácil.
Temos uma legião de divindades que movem o mundo para que possamos alcançar nossos objetivos e sermos pessoas melhores para nós mesmo, para o sagrado e para as pessoas a nossa volta. - Até porque "tudo que move é sagrado". Basta com que, em todas as nossas ações, lembremos que somos filhos de divindades que nos pedem muito pouco - e que nos dão o direito de alimentarmos o lobo que a gente quiser.

O que não se pode esquecer é que a receita é simples e fiz questão de colocar no começo desse pensamento. Candomblé não é lugar par o lobo do mau e seus predicados. Sabemos bem que candomblé é a celebração da vida, da cooperação e interação da natureza sagrada e a natureza humana. Podemos ser melhores sim, pois essa é a verdadeira missão. Nossos desejos são muito poucos, e por mais que se queira mudar, modernizar, comercializar, nada é possível se não nos voltamos para praticar o exercício de ser, de fato, L'essé Orisá.

[Roger Cipó © Olhar de um Cipó - Todos os Direitos Reservados / All Copyrights Reserved]

8 de setembro de 2015

A Síndrome do "No meu Tempo..."






"No meu tempo, era assim..." 

"No meu tempo, Yawo era assim..." 

"No meu tempo, Orixá não fazia assim..."

"No meu tempo, Ogan era assim..."

"No meu tempo, isso... No meu tempo aquilo... No meu tempo, no meu tempo, no meu tempo..." 


Chega de "No meu tempo", né? 


To pra conhecer alguém que nunca tenha ouvido a expressão "no meu tempo", antecedendo uma certeza absoluta para dizer que, "em algum tempo", o candomblé era de verdade. 
A expressão é tão presente que, desde cedo, a gente vai aprender a lógica saudosista de só esperar a brecha de do mais novo, para sentir o gosto de dizer: "no meu tempo...", e dar lição de moral. 


Eu até entendo quando os Agbás, indignados, contam os bons feitos de outrora, e expressam suas decepções. Entendo sim, e faço quórum para dizer que temos assistido uma banalização da religiosidade e da fé, nos orixás. Muito por influência dos males de uma sociedade imediatista, capitalista e pautada em superficialidades, que muito me assusta. No entanto, é de responsabilidade nossa lutar por conscientização - e por que não dizer reeducação? - sobre a importância do bem cuidar, do respeito, e atenção, para que os cultos se perpetuem. É nesse lugar de refletir,  me encontro amparado no alerta de Mãe Stella de Oxóssi que chama atenção de todxs - do mais velho ao mais novo - e nos responsabiliza: "Meu Tempo é Agora". 


Sim! É agora e não podemos mais perder tempo com saudosas ilusões e críticas sem elas não nos tiram do lugar de inercia, para ação. 
Sabemos sim que há muito o que se acertar - e não falo das questões ritualísticas individuais de cada casa. Falo, principalmente da consciência e responsabilidade com a cultura religiosa. Falta mesmo de seriedade na condução e educação de nossas comunidades, e talvez, é desses lugares de irresponsabilidades que surgem espaços para excessos e tanta displicência que, infelizmente, assistimos todos os dias. 


Mahatma Gandhi, líder pacifista Hindu, nos ensina que "devemos ser a mudança que queremos no mundo", por isso, penso eu que só falar que "no meu tempo" o mundo era melhor, não ajuda a transformar aquilo que não nos agrada. - Talvez, esse tipo de fala nos distancia da realidade.

Precisamos participar da mudança, de forma que aconteça, primeiro em nós mesmo, e depois nos abrirmos para colaborar nas transformações do outro. 
Talvez, perdemos muito tempo choramingando ( ou mesmo, quem sabe para inferiorizar as verdades presentes), cuspindo aos quatro ventos o quão melhor era o passado.
Nessa de "no meu tempo", acabamos mesmo por perder a noção do tempo em que  estamos e qual o tempo queremos, para o amanhã. 


O que vai ser do amanhã? Não sei - já disse que muito me preocupo, mas penso que, pelo menos agora, já é hora de acabarmos com a síndrome do "no meu tempo", se nos tornarmos parte da solução. 
Creio que um bom remédio para tal doença, seja boas doses de "Meu tempo é Agora". Precisamos acordar para a coletividade e entendermos de vez que "sou parte desse tempo", porque vivo, respiro e moro aqui.

Os erros e acertos desse tempo, nos pertencem, da mesma forma que glórias passadas, que em um outro tempo, também teve lá seus desacertos. 

No mais, eu ainda fico me perguntando: O que esperamos para fazer desse tempo, um tempo melhor para nós e para as divindades?  Pois, em Passado, Presente e Futuro, o Tempo sempre será um Orixá importante para o tempo de vida de cada um.

Roger Cipó © Olhar de um Cipó - Todos os Direitos Reservados / All Copyrights Reserved


19 de agosto de 2015

Dia Internacional da Fotografia e Meu Encontro com o Axé


Hoje, 19/08, comemora-se o Dia Internacional da Fotografia.
Embora tenha tido bons professores, orientadores e inspiradores para a minha carreira profissional, sempre associo a minha atuação à gratidão eterna aos Orixá, pelos caminhos trilhados até aqui.
Há um ano, escrevi esse pensamento e compartilho novamente: 


Minha chegada no Candomblé coincidiu com a descoberta particular pelo Mundo da Fotografia. Se o Amor pela Fotografia floresceu fácil, por outro lado, o Amor pelo Candomblé foi o que chamo de "pagar a língua".
 Sim, fui do tipo que criticava, atravessa rua pra não esbarrar com 'macumbeiro', e falava... falava muito, sem saber de nada.

Acontece que com o tempo e vivência, a religião dos Orixás se tornou prioridade apaixonante, um universo que me acolheu, despertou um Amor e Fé jamais sentidos. Um verdadeiro encontro ancestral que, dia após dia, me toma de Emoção e devoção por tudo que há de sagrado em minha história. Foi o candomblé que me ensinou sobre quem eu era de verdade. Candomblé se tornou meu Ponto de Paz, e eu já estava do outro lado do jogo. Do lado de cá, me perguntava os porquês de uma religiosidade tão linda e completa, ser brutalmente discriminada, apedrejada... E violentada, em todos os sentidos, por uma sociedade cruel e desinformada. Por que somos cruéis, ao ponto de "satanizar" Deuses, Reis, Rainhas, seres Divinos que, com seus encantos e magias, agraciam e protegem seus descendentes numa terra de tanto descaso? Por quê? Por que eu não acordei antes? E por que eu vestir os olhos do opressor por tanto tempo? Quando, na realidade, eu só estava oprimindo a força que vive em mim.

Foi ai que percebi que a arma estava em minhas mãos.  E logo, fui pra Guerra! Juntei o Amor pela Religiosidade com a Paixão em mostrar os pontos de vistas a partir de imagens e passei a compartilhar com o mundo toda emoção e belezas que a presença de Orixá nos possibilita. E assim vou! Certo da opinião de que "Se todos vissem quão rico o candomblé é, a falta de respeito seria menor, a violência e preconceito, se tornariam respeito e submissão", sigo fazendo a minha parte. Com os pés no chão, olhos atentos para eternizar momentos, ou simplesmente me emocionar com a Beleza e Humildade que Orixá compartilha ao sair pra dançar ou acariciar um filho seu.

Peço ao meu Orixá que nunca me desampare nessa luta. Me dê condições e atenção para contar o que vejo e, quem sabe, inspirar que mais pessoas mudem de opinião e se permitam apaixonar pela religião mais linda que o mundo pode criar. A Oxalá, eu agradeço  por  me abrir os olhos a tempo.

4 de agosto de 2015

Sobre Encontrar Obaluaie, em plena Segunda-feira


Antes que o dia se acaba, preciso falar do presente que ele meu deu. Sim, tudo bem que o seu maior presente é o Silêncio, mas esse eu compartilho porque o Rei me entende.

Estava eu, calado e reflexivo sobre o papo inspirador com a fotógrafa Monica Lachman, uma irmã que vem registrando de maneira linda as belezas do candomblé de Curitiba. Sentado no universo das escadarias do Teatro Municipal de S
ão Paulo, rodeado pelas mais diferentes realidades que ali pararam como eu - gente que tinha acabado de sair do trabalho e parou para esperar alguém, gente que vive à espera de alguém, gente que não espera por mais nada nessa vida, gente que cansou de esperar e agora senta e vê a vida passar... gente sentada na vida, das eruditas e sujas escadarias do "Palácio da Arte Refinada" de São Paulo...
Lá estava eu, sentado, vendo a vida passar nos diversos degraus enquanto lia e relia as mensagens de Monica, que concordava muito comigo quando dizia em meus textos teclados sobre as lindas oportunidades de registros de amor que Orixá nos proporciona quando mergulhamos no mundo do candomblé com nossas câmeras fazendo linha entre o Coração e o Olhar.
Mas foi coisa de segundos... e foi no mundo entre abaixar a cabeça para ler a nova mensagem que saltava o display do telefone e olhar a porta do Shopping Light para ver se quem eu esperava tinha chegado, percebi um turbante e um gorro branco ressaltados pelo brilho do sol das 17h e alguma coisa. Sim, o entardecer no centro trazia a fé de um rapaz e uma moça de braços dados, dividindo apoio para o singelo balaio coberto de pano branco.

Quase que sem pensar, esqueci o chat com a querida amiga e fotógrafa, passei a mão na bolsa, achei minha camêra e segui em olhares, aquela dupla reluzida em entardecer.

Parecia mesmo cena de filme (ou eu que sou dramático), mas enquanto eu disparava, ainda que discreto, na direção dos dois, a multidão apressada insistia em fazer com que eu os perdessem de vista, restando para mim o caminho de orientar-me pelos seus turbantes e gorro igualmente brancos e destacados na multidão. 





Eu já estava pronto para atravessar a rua correndo, quando percebo que o farol fechara: Alívio!
Parei na esquina e fiquei esperando por aqueles que traziam a cura em Axé de Rei. Eu que nunca faço isso, gaguejei (É sério, eu estava emocionado!): Boa Tarde, eu posso contribuir com vocês? - Eehh, Cipó! Você é do santo, não é essa a palavra certa - Pensei, e logo tratei de me apresentar direito, antes de pedir para fazer um retrato. Mas não deu tempo de posar não, enquanto eu buscava um angulo legal e o melhor momento para o registro, populares foram se achegando, tomando (ou me dando) a minha cena para registrar a minha felicidade de encontrar alguém em pleno rito de Sabejé pelas ruas de São Paulo. 

- Oi, vocês estão dando pipoca? 
Disse a senhora que se aproximou e, como pipoca, discretamente estourou seus problemas pessoais com aqueles dois jovens religiosos na esperança de uma palavra ou receita de conforto, em uma mão cheia de flores que brotam do milho em contato com o fogo.

Foi nesse momento que meu mundo parou mais uma vez. Parou e consegui congelar na imagem que compartilho.
Congelei a foto, mas se move em mim.
E desde cedo, toda vez que olho essa imagem e visito a cena em minha memória, fico imaginando o quão foi importante para aquela senhora encontrar com esses dois filhos de Orixá. A senhora que poderia estar saindo de uma rotina cansativa de trabalho chato, ou vindo de uma consulta no médico, ou vindo de qualquer outra direção não tão agradável... A senhora que andava nas ruas pensando na cura que em algum momento te tirava a paz, se deparou com Obaluaie, o Rei Senhor da Terra, Dono Absoluto de todas as vidas, A força que possibilita renovação, personificada em balaio de palha carregado por quem crê que a Pipoca cura e floresce em melhora de Mundo. 





O que eu aprendo com isso? De verdade, não consigo explicar ainda, mas sei que desde que comecei o chat com Monica, depois de receber um alívio em forma de mensagem, numa segunda-feira que inaugura o tempo de resignificar a vida, após reencontrar a força maior em dois seres que vestiam branco e refletiam os raios de Sol (o astro rei é a Força de Omolu no mundo), e depois de presenciar o pedido de remédio para alguém que teve a benção do Senhor Tempo para cruzar, na encruzilhada do Teatro mais requintado da cidade e gritar humildemente pela ajuda de quem não conhece, mas que a alma reconhece, só consigo dizer que a força existe e que movimenta o mundo para que possamos sim interagir e provocar as mudanças em nós mesmo.

Sim, todos nós temos um pouco de sementes que precisam do calor de brilhos de sol - que podem reluzir em qualquer lugar, mas suas forças se encarregaram de, na hora certa, provocar o desabrochar das coisas mais singelas em nossas vida... fazendo-nos pipocas. Fazendo-nos estourar em flores que curam e renovam a vida de nós mesmo.

Eu só Agradeço...
Silêncio! 


 Roger Cipó © Olhar de um Cipó - Todos os Direitos Reservados / All Copyrights Reserved