8 de setembro de 2015

A Síndrome do "No meu Tempo..."






"No meu tempo, era assim..." 

"No meu tempo, Yawo era assim..." 

"No meu tempo, Orixá não fazia assim..."

"No meu tempo, Ogan era assim..."

"No meu tempo, isso... No meu tempo aquilo... No meu tempo, no meu tempo, no meu tempo..." 


Chega de "No meu tempo", né? 


To pra conhecer alguém que nunca tenha ouvido a expressão "no meu tempo", antecedendo uma certeza absoluta para dizer que, "em algum tempo", o candomblé era de verdade. 
A expressão é tão presente que, desde cedo, a gente vai aprender a lógica saudosista de só esperar a brecha de do mais novo, para sentir o gosto de dizer: "no meu tempo...", e dar lição de moral. 


Eu até entendo quando os Agbás, indignados, contam os bons feitos de outrora, e expressam suas decepções. Entendo sim, e faço quórum para dizer que temos assistido uma banalização da religiosidade e da fé, nos orixás. Muito por influência dos males de uma sociedade imediatista, capitalista e pautada em superficialidades, que muito me assusta. No entanto, é de responsabilidade nossa lutar por conscientização - e por que não dizer reeducação? - sobre a importância do bem cuidar, do respeito, e atenção, para que os cultos se perpetuem. É nesse lugar de refletir,  me encontro amparado no alerta de Mãe Stella de Oxóssi que chama atenção de todxs - do mais velho ao mais novo - e nos responsabiliza: "Meu Tempo é Agora". 


Sim! É agora e não podemos mais perder tempo com saudosas ilusões e críticas sem elas não nos tiram do lugar de inercia, para ação. 
Sabemos sim que há muito o que se acertar - e não falo das questões ritualísticas individuais de cada casa. Falo, principalmente da consciência e responsabilidade com a cultura religiosa. Falta mesmo de seriedade na condução e educação de nossas comunidades, e talvez, é desses lugares de irresponsabilidades que surgem espaços para excessos e tanta displicência que, infelizmente, assistimos todos os dias. 


Mahatma Gandhi, líder pacifista Hindu, nos ensina que "devemos ser a mudança que queremos no mundo", por isso, penso eu que só falar que "no meu tempo" o mundo era melhor, não ajuda a transformar aquilo que não nos agrada. - Talvez, esse tipo de fala nos distancia da realidade.

Precisamos participar da mudança, de forma que aconteça, primeiro em nós mesmo, e depois nos abrirmos para colaborar nas transformações do outro. 
Talvez, perdemos muito tempo choramingando ( ou mesmo, quem sabe para inferiorizar as verdades presentes), cuspindo aos quatro ventos o quão melhor era o passado.
Nessa de "no meu tempo", acabamos mesmo por perder a noção do tempo em que  estamos e qual o tempo queremos, para o amanhã. 


O que vai ser do amanhã? Não sei - já disse que muito me preocupo, mas penso que, pelo menos agora, já é hora de acabarmos com a síndrome do "no meu tempo", se nos tornarmos parte da solução. 
Creio que um bom remédio para tal doença, seja boas doses de "Meu tempo é Agora". Precisamos acordar para a coletividade e entendermos de vez que "sou parte desse tempo", porque vivo, respiro e moro aqui.

Os erros e acertos desse tempo, nos pertencem, da mesma forma que glórias passadas, que em um outro tempo, também teve lá seus desacertos. 

No mais, eu ainda fico me perguntando: O que esperamos para fazer desse tempo, um tempo melhor para nós e para as divindades?  Pois, em Passado, Presente e Futuro, o Tempo sempre será um Orixá importante para o tempo de vida de cada um.

Roger Cipó © Olhar de um Cipó - Todos os Direitos Reservados / All Copyrights Reserved


Um comentário:

  1. Existe outra expressão correspondente, verbalizada no nosso meio de adeptos do candomblé nos termos "tradição não evolui". Mas quando perfaço meu olhar sobre a formação do candomblé encontro originalidades que significam a incorporação de outros elementos do período correspondente a "no meu tempo" aos dias de agora, como a introdução de refrigerantes, oferta de bolos confeitados a Orixá, até como pagamento de promessa, uso de microfone, terreiros em formato de anfiteatro (grego), entidade que faz consulta por celular, bebe cerveja gelada, etc etc etc. O candomblé é o resultado do sincretismo das diversas nações africanas que foram trazidas.é uma comunidade aberta. "Meu tempo é agora", e me responsabilizo em viver essa tensão entre o preservar e o inovar.

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