19 de outubro de 2015

Rumbê e a Experiência de Fazer a Pedra Falar



Dentro do candomblé, nada é mais valioso que saber fazer a pedra falar. O Orisa é a pedra dentro do Igbá, que se complementa com favas, raízes, elementos diversos. Não adianta termos conhecimento sem termos a malícia que só o dia-a-dia nos ensina para fazer a pedra falar. 

Um dia meu pai fez um teste comigo que vou contar: 

"Mais ou menos pelos meados do ano de 1995, eu tinha 5 anos de santo, e meu pai chegando ao terreiro colocou uma esteira no chão e disse que era para que eu tomasse um banho de folhas, vestisse uma roupa de ração limpa e sentasse na esteira. Me deixou esperando mais ou menos por 1 hora, e já impaciente indaguei se podia sair de lá. Ele disse que eu era muito apressada, e que esperasse que ele iria dizer o que queria. Pois ele foi tomar café, ficou conversando com o povo que estava lá e nada de me falar o que queria.

Depois de infinitas horas ele mandou a ajoie dele chamada de Mãe Cilinha buscar três pedras dentro de um coité e pediu que eu escolhesse uma. Logo pensei que iria virar de santo, pois tudo naquela época que acontecia Iyawo virava. Mas nada, nada aconteceu. Então disse que eu colocasse a pedra na minha frente e ficasse olhando para ela, vendo formato, cheiro, cor, textura, assim fiz, e ele mandou que eu não saísse de lá. Fiquei entediada de tanto analisar aquela pedra, ainda mais imaginando o porquê daquilo. 

Bom, ele voltou depois de um tempo e disse que era para levar aquela pedra para casa e que fosse observando ela e cantando todos os dias uma cantiga de um determinado orisá e não deixasse ninguém colocar as mão nela. 

Obedeci, fui para casa e depois de 15 dias fazendo o que ele me pediu enfiei aquela pedra na bolsa e voltei para o terreiro. Quando cheguei lá a primeira coisa que ele me perguntou foi da danada da pedra, e mostrei para ele que estava comigo e que tinha feito tudo como tinha ordenado. Me mandou sentar novamente na esteira e tirou a pedra de mim.

Pouco tempo depois chegou com umas 30 pedras e mandou eu dizer a ele qual delas tinha ficado comigo aqueles dias, foi um susto para mim, pois eram muitas, mas com muita atenção eu achei e mostrei com convicção. Meu pai sorriu e me elogiou, e perguntou se eu tinha ouvido a pedra cantar comigo a cantiga que ele falou para cantar todos os dias, dei risada e meio no respeito e no deboche disse que pedra não falava. Pai balançou a cabeça e disse: "Minha filha essa pedra ficará em seu futuro jogo de búzio, e ela será Esú, aquele que trará o recado dos orisa, e se você perguntar para ele algo e não ouvir a pedra falar não adiantará ter um jogo de búzios".
Fiquei de olhos arregalados e sem fala. Quando perguntei qual era a magia para conseguir escutar ele respondeu, que era a malícia da dia-a-dia do meu conhecimento que faria isso, que a magia estava dentro de mim, era só abrir os ouvidos e escutar, mas de uma coisa não poderia esquecer jamais, que era cantar para essa pedra sempre, assim ela reconheceria minha voz e me responderia quando precisasse de resposta.
 Até hoje essa pedra fala comigo."

Sua benção meu pai.

Experiência e texto de Iyá Branca de G'unté (Minha Mãe!) 

Foto: Roger Cipó © Olhar de um Cipó - Todos os Direitos Reservados / All Copyrights Reserved


4 comentários:

  1. Amei a história!!!! e que sabedoria tinha seu Pai!!!
    Pena que tive pouco tempo com meu zelador, aprendi pouco
    ficavamos pouquissimo tempo junto! Que saudade dele!!!

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  2. Sempre com excelentes textos e informações. Parabéns!

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  3. aprendizado!!!obediencia e a base da sabedoria.

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  4. Aprendizado! !! obediência é o verdadeiro caminho para a sabeberia.

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