9 de novembro de 2015

Elba Ramalho e Alexandre Frota: As Desculpas da Opressão




Onde eu nasci, diziam que "depois que inventaram a desculpas, pilantra nenhum tomou tapa na cara", e essa foi a primeira coisa que me veio à cabeça quando assisti o depoimento de Alexandre Frota, após lembrar que Elba Ramalho também se redimiu, pelo mesmo motivo: Desrespeito às Religiões de Matriz Africana.

A expressão acima, usada por mim, pode ser ignorante, mas é a grosso modo mesmo que a relembro, para dizer que pedir desculpas é muito fácil, muito fácil quando se comete um crime de Intolerância Religiosa.

É muito fácil para Elba Ramalho ligar a câmera de um smartphone e gravar um vídeo pedindo perdão para o Candomblé e Umbanda por "não bem entender" as nossas particularidades e reforçar a idéia de demonização às Divindades Africanas. É fácil porque fica "elas por elas" e a cantora famosa não responde legalmente por um crime de Intolerância Religiosa ao fazer mal uso de canais de comunicação para espalhar inverdades, violentando e desrespeitando a fé alheia. É muito fácil, e a gente acredita.

É muito fácil para um cara como Alexandre Frota fazer piadas nojentas e machistas, usando a figura de uma sacerdotisa como brinquedo sexual, e depois ir até um terreiro, em um evento público, pedir desculpas, chorar e ainda receber palmas de consolo. É fácil porque o Frota, com a sua prepotência preconceituosa, não será indiciado por crime de intolerância religiosa e possível estupro.  É fácil! 

Coincidência ou não, duas figuras públicas decidiram pedir perdão às religiões de matriz africana por conta de seus "desconhecimento" - como Elba Ramalho tentou se desculpar, e pelas "brincadeiras de mal gosto" - como chorou o Frota.

Respeito o direito de resposta, mas preciso lembrar que cometeram um crime e que deveriam ser responsabilizados legalmente, principalmente porque a intolerância religiosa mata e o propagar do tipo de conduta como a de vocês é o que dá margem para outros brincalhões fanáticos sintam-se no direito de queimar terreiros, apedrejar crianças, ou até abusar sexualmente de meninas  e mulheres.


Na semana passada, um vídeo testemunho de Elba Ramalho durante um culto em igreja ganhou as redes sociais, chamando atenção para a "salvação" encontrada pela cantora, na igreja, após seu contato com terreiros, e Exú - o que segundo ela, seria o Demônio. Poucos dias após a viralização do vídeo, milhares de respostas em repúdio foram postadas nas redes sociais, a produção da artista retirou o vídeo testemunho do ar e imediatamente, a cantora enviou um vídeo com pedido de desculpas ao Candomblé e Umbanda. Fácil pedir desculpas assim, né? 

Há um ano atrás, Alexandre Frota contou uma "piada" no Programa Agora é Tarde de Rafinha Bastos, de forma extremamente pejorativa, que narrava como obteve relação sexual com uma Mãe de Santo. A verdade é que, qualquer pessoa que assisti ao depoimento com calma, vai entender que a história contata por Frota remete, não à uma brincadeirinha, mas à uma "piada" de tentativa de estupro.



 "Ai eu fiquei olhando aquele bundão, e falei: 'po! vou comer, vou pegar. Ai, pô, cheguei pra ela e falei: Ai, deixa eu te falar uma parada. Eu não acredito nessas paradas que você faz - não sei o que, e coisa e tal... Mas eu queria te dar uns pegas (...) E aí, tem jogo?' Ela ficou assim mesmo (comentando sobre o silêncio da Mãe de Santo), não falou nada e eu falei, vou pegar... Aí virei e pô, botei a Mãe de Santo de quatro assim... aí eu tava preocupado com as minhas amigas lá fora, então garrei assim pela nuca (...)" - contou o ator que disse que ao fazer muita pressão na nuca, a mulher dormiu (leia-se desmaiou sufocada - porque isso que é).


A forma dos artistas brasileiros de fazerem piadas é uma das mais violentas do mundo, porque em sua maioria, usam da "comédia" para oprimirem ainda mais classes e indivíduos socialmente oprimidos e excluídos. Nossos comediantes, em quase maioria tem como alvo de piadas, negros, gays, lésbicas, transexuais, mulher, pobreza, nordestinos, e outros grupos colocados à margem social do fundamentalismo e conservadorismo.

Sou chato. Sou sim, porque é inaceitável fazer piada com a mulher quando uma das principais causas da morte de mulheres brasileiras é a violência sexual. E quem vê graça nisso? O Alexandre Frota vê!

 É inaceitável fazer piadas com sacerdotes e sacerdotisas de matriz africana em um país onde as comunidades de terreiros sofrem historicamente um processo de caça às bruxas e demonização, e na maioria dos casos de intolerância religiosa que culminam em agressão física, as mulheres são violentadas.

É covarde, irracional, repugnante. É criminoso.
E crimes devem sim ser encarados como tal.

Desculpas são bem vindas, mas respostas legais são também e devem acontecer para sirva de exemplo e outros criminosos não se sintam no mesmo direito de atentar contra as religiões de matriz africana.

Clique para assistir o pedido de desculpas de Frota, durante o evento "Toque da União", realizado ontem, 08/11, no Terreiro Batistini, em São Bernardo do Campo. 

É importante que o povo de santo também acorde para essas questões, pois se nossa luta é pela criminalização eficiente da Intolerância Religiosa, porque criminosos nos ganham nas desculpas? É fácil, né? Sim, o fato de um ator ir até um terreiro de candomblé para pedir desculpas e chorar, é fácil sim. Alguém treinado para chorar, sorrir, sentir prazer e tantas outras expressões em públicos, sabe bem comover com pedidos de perdão.

Verdadeiros ou não, os perdões de Elba Ramalho e Alexandre Frota nos foram pedidos e estão ai pra quem quiser, comprar, mas suas ações intolerantes seguem marcadas em nossa história. São só mais algumas chibatas de uma sociedade racista em nossas costas. Esquece quem quer, pois eu não. Mas se as desculpas estão aí, a gente que se organize para cobrar que ele e ela não tenham novas recaídas e não tornem a desrespeitar-nos. Ou quem sabe, poderíamos sugerir que usassem de suas famas e acessos à grande mídia para publicizarem seus arrependimentos. Seria um pouco mais justo, né? Oras, continua fácil usar um programa de TV de canal aberto para hostilizar a fé alheia e pedir desculpas em um pequeno vídeo de internet, ou em evento fechado com menos de mil pessoas. Embora as mensagens foram direcionadas a quem é de direito (povo de santo), sabemos que a sociedade em geral precisa entender o quão desrespeitoso foram tais condutas para que os "exemplos angelicais" (ambos vestidos de branco, viram?) de Elba Ramalho e Alexandre Frota, incentivem outros opressores.


Aguardemos os próximos arrependidos. E talvez, eu mude de idéia e acredite no arrependimento quando ambos somarem às lutas do povo de axé contra os crimes de intolerância e violência contra a mulher brasileira e fazerem com que seus seguidores e seguidoras pensem diferente e com respeito às nossas lutas e histórias. Antes disso, repito que não compro lágrima barata.

5 comentários:

  1. Sensacional!
    Desculpas, sim, isso é um DEVER.
    Punição, SIM, isso é uma OBRIGAÇÃO.
    Parabéns pela postagem.

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  2. Concordo em genero,numero e grau.
    Meu comentario sobre o assunto nas redes sociais foi bem parecido.Quase um resumo do seu texto.

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  3. Apoiado, desculpas sim nossa fé assim nos ensina, mas os rigores da lei devem ser impressos para que outros desatinos não sejam cometidos sabendo que depois é só vestir branco e pedir desculpas.

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